16.11.04

Um dia em 1940

A avó levantou-se cedo, como era o habitual, à hora em que o padeiro metia o pão no saco, à porta.
Dali a nada era a leiteira e precisava de estar vestida para a atender.
Atiçou o lume, que de Inverno ficava sempre aceso, para aquecer um pouco a casa, que era grande e não tinha lareira; mais tarde mandaria buscar o borralho para acender o braseiro.
Precisava de ir à mercearia, comprar ¼ (125 gr.) de manteiga que a que fazia em casa com as natas de ferver o leite já estava rançosa, embora numa tigela dentro de água, como de costume. Compraria também uma penca para o cozido de Domingo, decerto a hortaliceira estava doente pois há dois dias não aparecia.
Do talho apenas precisava da carne para cozer e uns bifes que deviam ser entalidos em azeite, para não se estragarem.
Da “fressureira” apenas os enchidos, e talvez umas tripas enfarinhadas.

Iria fazer uma estravagancia, comprar uns morangos temporões.
A Água da caldeira do fogão estava bem quente para se lavar e fazer o café.
Vestiu-se, penteou-se e pôs um pouco de pó de arroz.
Precisava de comprar umas meias de lã, que as do ano anterior já estavam muito passajadas, uma combinação e uns lenços de assoar.
Depois das compras iria acender o ferro para passar a blusa e uma pecinhas que deixara de véspera por passar com o ferro de mão.
À tarde iria fazer uma visita à Sra. D., saber novidades e jogar o loto; levaria a neta com ela, como já era hábito.
Chá e torradas seriam servidos à merenda e leite com bolachas para os meninos, no jardim.
Depois do jantar, uma sopa apenas, tinha que ir ao Teatro dar uma injecção à fadista por causa da voz.
A colcha de croché que andava a fazer para a neta teria que esperar pelo dia seguinte.
Rezou o terço e deitou-se cedo, depois de por o bacalhau de molho para dali a dois dias.
Tinha tido um dia muito agitado e adormecera rápido na cama de folhelho bem aquecida com a botija de água quente.
( os anos passam, mas os “cheiros” ficam…)


3 comentários:

Anónimo disse...

...os "cheiros" da casa da minha querida avó...que saudades daquela vida tranquila da minha infancia tao boa. emocionada, obrigada querida Theo.

Anónimo disse...

Perinhas assadas, na panela de barro.........trazidas a pé pela minha tia avó que morava noutra aldeia........o leite ainda morno na leiteira de aluminio, deixada à porta de casa, com o saco de pão cheio para cinco meninos .......marmelada do marmeleiro do quintal.............assim vivi eu um belo verão inteiro, neste país, no final da minha infancia....
Que bom, Theozinha fazeres-nos viajar por breves instantes, para esses sabores e cheiros.....

Anónimo disse...

Não dado a recordações,nem sei mesmo se gosto de recordar,mas gostei de lêr o que escreveu.
EDU