Os Finais
Ana Rita começou a ter atitudes estranhas a partir do momento em que soube, pela amiga, do estado financeiro da firma. Em conjunto decidiram vender a fábrica antes que fosse decretada falência e não se salvasse nada. Depois de pagar aos credores e funcionários ainda era possível retirar o suficiente para, com a venda de algum património, recomeçar qualquer negócio modesto, mas para o qual AR não estava de todo preparada.
Maria da Graça estudou com ela todas as hipóteses, ajudada com o advogado, mas foi quando vislumbrou o futuro negro que a esperava que AR começou a sentir os efeitos de um esgotamento seguido de uma enorme depressão.
Deixou de comer e só saia de casa para tratar do absolutamente necessário, sempre acompanhada de MG.
A degradação foi fulminante, começou por vender dois dos carros e pôs a vivenda do Estoril à venda, retirando-se para a casa de campo, perto da Ericeira. Isolou-se de tal maneira que se não fosse MG teria enlouquecido mais cedo do que se veio a verificar já os negócios tinham sido resolvidos e a quantia que recebeu, uma pequena fortuna, veio não só fazer face às necessidades do momento como a deixava rica para o resto da vida, tarde demais no entanto para obstar a que a demência se manifestasse e progressivamente se instalasse ao ponto de MG ter de a internar, pois já ninguém queria tomar conta dela. A pouca família que possuía, já que os filhos viviam todos no estrangeiro, foi-se afastando ou foi por ela afastada com a obsessão de que a estavam a roubar; não passava um dia que não contasse durante longas horas o pouco dinheiro que conservava em casa e até para comprar comida fazia contas sem fim.
Pouca gente se apercebeu da súbita riqueza de MG, das suas extravagâncias, domésticas, é certo, mas nunca antes vistas; às poucas pessoas que disso se deram conta MG dava uma explicação atabalhoada e desviava a conversa, se necessário. O certo, porém, é que tudo começou pouco depois de ter estado no norte com AR e ter feito aquela auditoria a seu pedido.
Houve quem dissesse que Ana Rita a remunerara convenientemente, houve quem desconfiasse que entrara em negociações encobertas com os sócios e recebera um bom e chorudo suborno. Se foi este o caso, Maria da Graça ficou sempre presa a esta culpa e não abandonou a amiga quando ela mais precisava.
A vida é tortuosa no seu rodar e qual banca da fortuna às vezes é mãe outras vezes madrasta, como se use dizer.
Vou fechar o computador, está a chegar a M. da Graça, hoje é dia da entrega do cheque que ela me vem trazer para que eu continue calada acerca das corrupções que lhe deram este bem-estar na vida e que lhe estava no sangue era ela ainda uma funcionária pública.
Ass.:
(uma "amiga" com visão)
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2 comentários:
Genial! O nome da MG foi escolhido ao acaso ou não? :))) Adorei o conto e a mestria com que foste construindo o suspense. Um grande beijinho de amizade e admiração!
Theozinha não te esqueças de mandar metade do cheque como combinámos...:d
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